17 fevereiro 2009

Nada mudou....

Gostava de ler o que o saudoso Prado Coelho escrevia, nomeadamente na coluna " O fio do horizonte" no jornal "Publico". Recordo um texto de 9 de Janeiro de 2002 "A pré-queda"que transcrevo:

"É certo que o período das festas não costuma ser de grande densidade informativa, mas os nosso telejornais (com a prestigiante excepção da SIC-Notícias e da RTP2) persistem na ideia de que devem preencher pelo menos uma hora.
Caso não haja um grande " acontecimento " do dia, como a demissão de Toni, que justifique, por exemplo, que o serviço público lhe dedique mais de meia hora de atenção, o habitual tem sido começar-se por uma notícia que nos jornais diários impressos ocupam dez linhas na página 20, estilo "Mulher esfaqueada, por motivos passionais, à porta de sua casa em Carcavelos" ou "Homem ia pagando 2000 contos por um almoço devido a um engano na conversão dos euros".
Como se vê pelo último exemplo, algumas destas importantes notícias são da ordem do quase-acontecimento. Não me espanta nada que um dia destes os telejornais portugueses abram o seu alinhamento informativo com algo do tipo:"Devido ao frio, mulher ia caindo de um escadote ao procurar um cachecol na parte de cima de um velho armário". Veremos então toda a equipa tiritante deslocar-se ao local do não-acontecimento, que poderá ser Vila Nova de Poiares, e começar a fazer um inquérito segundo as normas que laboriosamente aprendeu nos cursos de Comunicação Social. Começa-se pela protagonista do sucedido, com a inevitável pergunta:"Como se sente neste momento, depois de ter estado quase a cair do escadote?" Pálida, ainda estremunhada, a mulher responde pela quarta vez que se sente confusa, mas está muito grata uma vizinha que a veio prontamente ajudar. Trata-se então, conclui o sagaz repórter, de ouvir a vizinha:"Como se deu conta de que a Dona Alzira poderia ter caído do escadote?" A entrevistada, feliz por poder comunicar na televisão, uma catadupa de pormenores: que a dona Alzira fez barulho e disse vários palavrões sucessivos, o que não está nos hábitos da senhora; que ela andava sempre a querer subir o escadote (pode-se nesta altura tentar ouvir um psicanalista) e que foi o miar assustado do gato que me levantou suspeitas. Como o jornalista sabe que é preciso dar dimensão política e social da ocorrência, vai então interessar-se pelo magno problema da segurança dos escadotes em Portugal: será que s~ºao seguros ?Será que o Ministério da Administração Interna, "ou quem de direito", certifica a qualidade dos escadotes portugueses ?Será que este escadote era um produto tailandês ? Haverá uma norma europeia para a produção de escadotes ?
Com isto já passaram dez minutos seguidos apaixonadamente pelas audiências. Nesse dia, Lobo Antunes pode até ter publicado o seu último romance, ou Pedro Tamen reunido uma vida de textos poéticos - podemos estar certos de uma coisa: as nossas televisões não dirão sobre eles uma só palavra."

E seis anos passados ? E agora o noticiário está muito pior. E as entrevistas ? Sem sombra de dúvida são ainda piores.

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